Parecia uma menina igual a todas as outras, mas era aí que
ela se diferenciava, tinha os modos estranhos, sentava sempre toda reta e se
dizia especial, de fato era, se olhar pela ótica de que não se parecia com
ninguém, nem da família, nem da rua...
A tia que a criara já havia deixado pra lá, tentar lhe
ensinar modos de boa moça já era impossível. Sempre dizia _ com dezessete anos
já não sei mais o que fazer dessa menina..., mas também era verdade que de
certa maneira admirava a sobrinha, que nunca dependia de nada, afinal mal dava
ouvidos ao que lhe diziam, e quando a incomodavam muito, ela fugia pra dentro
de um livro, e lá ficava o dia todo...
Todos da rua já sabiam que Lua era assim mesmo, vivia, com o
perdão do trocadilho sem criatividade, mas que caia como uma luva, aluada. A
tia Jujú como todos chamavam, tinha mania de dizer que se a mãe não a tivesse
dado este nome tão atípico antes de abandonar a pobre menina, talvez ela não
fosse assim. Mas sabia que no fundo ela era exatamente como a mãe...
Lua descia a rua, quieta, numa manha ensolarada, quando viu
pela primeira vez o novo vizinho, um homem de cara enferrujada e dentes
estranhos, olhou e riu, ele olhou e não esboçou nenhuma reação. Logo atrás
vinha um menino com uma mochila grande e um skate, menino franzino e de certa
forma, feio.
Olhou atentamente para onde eles iam e viu que ocupavam a
casa que estava à venda no fim da rua, o menino olhou pra trás e acenou com a
cabeça, mas Lua já estava voltando aos gritos da tia, que avisava que ela havia
esquecido um livro... pensou, que vergonha, titia gritando meu nome no meio da
rua e as pessoas todas vendo, fossem esses mesmos de sempre, tudo bem, mas há
vizinhos novos...
Uma semana depois de ver seus novos vizinhos na rua, Lua
ouve sua tia comentar que o Sr que alugara a casa estava procurando empregadas,
a tia muito fofoqueira comentava que achava muito estranho um senhor com filho
não ter uma esposa, como acontece nessas ruas em que todo mundo se conhece,
todos sabem de todo mundo e alguém novo sempre faz todos se interessarem,
exceto Lua que achava isso mais do que uma indelicadeza, achava ridículo, ao
que a tia confirmava que nem os hábitos das outras mulheres da rua sua sobrinha
era semelhante.
As coisas aconteceram mesmo depressa, logo a rua inteira sabia
que o Sr. Rocco e seu filho vinham do norte, após uma onda de febre amarela em
que sua esposa havia falecido, vendera tudo e viera ao sul com o filho. Logo
também já se sabia que era um homem rico, vivera dois anos na construção de uma
usina, mas a mulher contraíra a doença dos índios e não sobrevivera, temendo
acontecer o mesmo ao filho, mudou-se.
Mas o que Lua mais gostou nos novos vizinhos foi o dia em
que a mudança que ainda faltava, chegou, nunca na vida ela tinha visto tantas
caixas escritas “livros”, pensou que talvez não fosse mal ficar amiga deles e
ter acesso a tantos títulos, embora nem soubesse de que livros estas caixas
estavam cheias, já pensou serem aventuras, romances...
Lua estudava pela manha, e certo dia ao descer a rua viu seu
vizinho caminhando em direção a parada de ônibus. Curiosa como só ela podia
ser, apressou-se e alcançou o menino, que logo vira, nem era tão feio assim.
__vai estudar no Antunes Jorge?
__oi pra você também, sim vou
__ me desculpe, sou Lua, e você?
__Lua? Entendi...Henrique
__ entendeu, o que?
__nada, fiz uma piada com o seu nome só isso, se não gostou,
desculpe!
__capaz, se eu contasse todas as vezes que ouvi piadas com o
meu nome eu não faria outra coisa... Eu estudo no Antunes Jorge, te apresento o
colégio se quiser.
__ claro, ia gostar...
Subiram no ônibus e seguiram.
O Antunes Jorge era o
colégio mais conceituado da cidade, ali estudaram muitos governadores e juízes.
Lua, que era de família humilde, estudava lá por que sua tia era amiga de longa
data de uma das supervisoras e conseguiu uma bolsa pra a menina, mas deste modo
era cobrada mais que todos...
Logo Lua e Henrique se tornaram amigos, estudavam na mesma
turma e sempre andavam juntos, e quanto mais se conheciam mais Lua percebia que
existia algo naquele garoto que parecia estranho, era um menino magrinho, mas
de olhos azuis e tristes, embora risse de tudo...
.....
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